Há muita gente falando sobre o comércio entre o Brasil e a China. O superávit brasileiro virou déficit, os produtos chineses estão inundando o mercado interno, roubando outros no exterior, é a "desindustrialização" que se inicia, e daí por diante, afirmam os mais exaltados. A coluna mesma intensificou o debate sobre as distorções não só com a China, mas outros parceiros comerciais.
A colega Marcia de Chiara, em reportagem bem documentada, mostra que, de janeiro a junho, o número de empresas importadoras dobrou, a maior parte voltada para a China, enquanto o de exportadoras diminuiu. Em julho eram 31.812 as importadoras e, no ritmo atual, devem chegar a 40 mil até o fim do ano. Exportadoras, 16.429. E estão recuando.
Marcia ouviu alguns dos novos importadores. Eles não estão comprando apenas mais eletrônicos,bens de menor preço, mas carros, máquinas, equipamento pesados. Tudo. A demanda interna aumenta e, graças ao câmbio, está mais barato importar do que produzir aqui. Os números do governo confirmam.
A indústria protesta. Está perdendo mercado interno e no exterior. O saldo comercial só se sustenta pela venda de produtos básicos, minério, soja, petróleo. Não consegue exportar mais e a produção declina ou estagna. Pede ação do governo. Benjamin Steinbruch, presidente da Fiesp e da CSN, afirma que não adianta apenas impor sobretaxa a alguns produtos importados da China ou de outros países. O governo fez isso no caso da indústria de calçados, que afundava. Ajudou, mas não resolveu. Os chineses passaram a reexportar para o Brasil do Vietnã (mais 127%) e Indonesia (mais77%). Até a Malásia vendeu 3 milhões de pares nos sete primeiros meses do ano... Tornou-se grande "produtora" de sapatos importados da China ou montados no país e reembarcados para o Brasil. E continua assim. Apenas um exemplo entre muitos.
Defender não é protecionismo. Steinbruch, que, ao contrário do seu colega de diretoria na Fiesp, Roberto Giannetti da Fonseca, não é classificado como o eterno "chorão", foi mal interpretado, no início. Ele não quer protecionismo, mas a defesa de alguns setores mais atingidos. Aqui, vamos esclarecer uma questão semântica: protecionismo caracteriza uma política de proteção global, que abrange todos os setores da economia de um país. Defesas comerciais tópicas é a proteção isolada e temporária que podem ser adotadas em determinadas circunstâncias especiais de concorrência "privilegiada". A coluna se recusa a falar em "concorrência desleal" porque lealdade não existe em economia e muito menos em comércio exterior. O que há é concorrência.
A China pode ser mais protecionista porque tem uma política oficial de câmbio desvalorizado, custos baixos, empresas estatais e custos irrisórios de mão de obra excedente. Repetimos: não dá para competir com a China no mercado mundial.
Mas a indústria e outros setores exportadores nacionais precisam mesmo de defesa? Sim,e muito. Simplesmente porque não há como competir com a China. Suas exportações têm preços imbatíveis. Em fórum da FGV realizado em SãoPaulo, Renato Amorim, ex-secretário-executivo do Conselho Empresarial Brasil-China, afirma que "as empresas chinesas encontram ótimos engenheiros a US$ 400 por mês. Não temos como competir com isso". As empresas chinesas trabalham com margem muito apertada, uma vez que não remuneram acionistas e não precisam dar lucro simplesmente porque são estatais.
O que existe hoje é o Estado chinês competindo com as empresas privadas brasileiras. Como diz o ex-ministro Delfim Netto, só há dois países no mundo inteiro que acreditam que a China é uma economia de mercado. Um, acredita com alguma dúvida, é a própria China. Outro, de maneira convicta, o Brasil. E conclui, repetindo o que esta coluna não se cansa de dizer, eles estão certos. Nós é que estamos errados.
Fonte: Alberto Tamer - O Estado de S.Paulo
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